Acabo de regressar de uma viagem de 9 dias por Itália. Milão, Roma e Siena foram as cidades visitadas. Esta viagem foi também uma demanda bibliográfica e fotográfica, tentando encontrar em todas as livrarias que ia descobrindo um livro de um grande fotógrafo italiano: Luigi Ghirri. Após inúmeras tentativas falhadas, comecei a pensar neste livro como um sagrado graal da fotografia: toda a gente o conhecia mas ninguém tinha exemplares disponíveis. Foi em Roma que a minha sorte mudou e encontrei o último exemplar disponível na livraria. Trata-se de uma antologia do trabalho de Ghirri, publicado pela Federico Motta Editore, Milão (2001). Todo o meu esforço foi plenamente recompensado pois trata-se realmente de um corpo de trabalho realmente único e fascinante. Inspirado pelas belíssimas imagens de Ghirri sobre a paisagem italiana, desenvolvi um trabalho novo que espero se torne numa sincera homenagem ao trabalho e sensibilidade deste excelente autor.
Fica aqui um pequeno texto de Ghirri:
O homenzinho à beira do precipício
Desde pequeno, as fotografias de que gostava mais eram as de paisagem, que via nos atlas, entre dois mapas de geografia.
Fascinavam-me muito particularmente as fotografias em que aparecia, inevitavelmente imóvel, um homenzinho esmagado pelas Cataratas do Niagara, montanhas, rochedos ou enormes salgueiros, palmeiras gigantescas ou então à beira de um precipício. Voltava a encontrar este personagem nos postais que representavam lugares mais menos célebres, empoleirado nos monumentos históricos, perdido nas ruínas do Forum romano ou debaixo da Torre de Pisa.
Este homenzinho vivia num estado de perpétua contemplação do mundo e a sua presença nas imagens conferia-lhes uma atracção especial. Era não só o metro padrão das maravilhas representadas, mas também a unidade de medida humana que me restituía o sentimento do espaço; em todo o caso, eu via-o assim, e pensava, por intermédio dele, que compreendia o mundo e o espaço.
Também gostava da ideia de que o fotógrafo nunca estava sozinho nestes lugares, mas que tinha sempre à disposição um amigo ou um conhecido com quem atravessava o mundo, ou o descobria, ou o representava. Nunca consegui ver de facto um, conferir-lhe uma identidade: o homenzinho era sempre um desconhecido para mim, mas acompanhava-me aos lugares mais desconhecidos e mais extraordinários que ele próprio via, contemplava, media.
Quando mais tarde comecei a fotografar, continuei a olhar para fotografias de paisagem, mas nunca mais encontrei o homenzinho. Sucediam-se fundos, cenários e espaços soberbos, mas cada vez mais desertos e mais incompreensíveis, desfazendo-se em pedaços e multiplicando-se de uma forma cada vez mais vertiginosa. Tudo isso me parecia inabitável, mais exactamente, os lugares tinham desaparecido e restavam esplêndidos cenários a preto e branco ou en technicolor, e o homenzinho já não estava lá; tinha-se ido embora, levando consigo a representação dos lugares e deixando-nos o seu simulacro."
Luigi Ghirri in Paesaggio Italiano, 1989